"Pé Esquerdo", por Ingrid Oyarzábal Schmitz
- Seu idiota, então não venha me buscar amanhã!
Foi assim que o meu telefonema com Dave acabou, parece um pouco triste, mas a culpa foi dele, já começando por ele ter me chamado de Miojo, será que ele nunca vai entender que o meu nome não tem nada a ver com massa, ele é tão simples, Meg.
Apesar de tudo isso espero que ele venha me buscar amanhã, afinal, vai ser o meu primeiro baile de formatura, quero que tudo seja perfeito. Contudo vou dormir agora, pois amanhã não posso estar com olheiras.
- Não, meu coração não, eu garanto que não sou boa, não faça isso, é a minha família, eles não merece, ta tudo bem, acaba comigo primeiro, NÃOOOOO!
Droga acho que eu tive um pesadelo. Só não entendi porque mesmo berrando no volume em que eu estava ninguém veio me acordar. Mas tudo bem, hoje não posso me estressar, pensando bem, posso sim, garanto que se o Leo estivesse aqui tudo estaria bem, meu irmão querido, esta vai ser minha primeira grande data sem ele, espero me sair bem.
O dia passou rápido, mas muito estranho, parecia que a rua inteira decidiu dormir o dia inteiro, silêncio absoluto. Usei esses fatos ao meu favor, liguei o som bem alto e fui tomar um banho de banheira, tudo estava ótimo, até que a água começou a ficar vermelho sangue e aquela musiquinha de filme de terror começou a ressonar nos meus ouvidos, tinha ficado menstruada bem no dia da minha formatura.
Eu não podia ter mais problemas, ainda bem que eu estava preparada para este. Logo tive que sair da banheira, fiz um rápido tratamento de pele e arrumei o meu cabelo, me maquiei e me vesti, não para me gabar, mas eu estava linda, e nas doze badalas eu não me transformaria.
Já quando soaram oito badaladas não me contive, cai no choro, Dave acreditou em minhas palavras. Entretanto meus pais poderiam me levar, mas onde eles estavam em lugar nenhum. Resolvi chamar um taxi, mas ninguém atendia. Pior não ficaria então resolvi ir andando, afinal o colégio não ficava muito longe.
Eu era uma modelo nas ruas desertas, mas aquilo realmente não parecia uma passarela e sim um comercial de xampu, “Seus cabelos não iram mais sofrem com a umidade”, mas as poucos o vento aumentou e a chuva também. Só imaginem cheguei lá ensopada.
Tinha começado a me acalmar, porém não havia ninguém ali. Imaginei que todos já estariam no salão, o alívio percorreu o meu corpo quando vi o salão lotado, mas aos poucos quando percorria o corredor lateral vi que aqueles não eram meus colegas, e muito menos eram gente viva.
Minha reação mais espontânea foi o grito, mas a música estava alta demais para isso, tentei sair correndo, mas escorreguei em uma poça de sangue, meu vestido branco se tornara vermelho, reparei aos poucos que além da multidão de seres havia corpos no chão, alguns colegas sem sorte. Senti algo gelado tocar em mim, uma mão sem pele, meu professor, ele me disse para ir embora logo, já que aquilo era normal, e dali a um dias todos voltariam a ser o que eram.
Fiquei pasma quando ao olhar em volta vi quem eram aqueles serem, todas as pessoas da cidade estavam ali, e meus colegas ao chão eram os que desmaiaram antes de sair dali. Aos poucos consegui tomar consciência, mas não foi o suficiente para me mexer, sem contar o cheiro de sangue que começou a me deixar tonta, tudo começou a girar, até que pareceu que eu estava flutuando.
Não pensem que eu adquirira poderes, era apenas meu irmão me carregando no colo. Leo disse que correra para chegar aqui o mais rápido que pode depois de ficar sabendo que estava tão próximo de acontecer este fenômeno na pequena cidade de Canoas. Demorou até eu assimilar a idéia, mas quem não demoraria, pois descobrir que você mora em uma cidade que de vinte em vinte anos a pessoas viram zumbis sem aviso prévio por uma noite. Só fiquei imaginando por que os mais novos estavam normais, ele também me explicou que isso só acontecia depois de certa idade.
Voltamos para casa, me limpei, liguei para o Dave e descobri que ele era um dos prováveis desmaiados já que ninguém atendera, vesti aquele pijama que ajuda em todas as horas, fiz pipoca, e eu e Leo ficamos conversando por um tempinho até cairmos no sono, acabamos ficando no sofá até nossos pais nos acordarem, como se nada tivesse acontecido. E a formatura acabou sendo transferida pois dizem as más bocas que ninguém acabou indo na data anterior, o motivo teria sido uma virose, já de Dave ninguém nunca mais ouviu falar.